terça-feira, 2 de outubro de 2012

Reproduzo aqui um estudo do Economista Eugénio Rosa sobre a manipulação que fazem os orgãos de informação a propósito das declarações feitas por um sujeito que eles promoveram a Eminência. A partir de agora o trabalho do Economista Eugénio Rosa passa a ser acessível a partir deste blog.




António Borges é um ignorante arrogante formado na escola da Goldman Sachs e do FMI                               



ANTÓNIO BORGES MENTIU DESCARADAMENTE QUANDO AFIRMOU QUE AS DESPESAS COM PESSOAL NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA REPRESENTAM 80% DAS DESPESAS TOTAIS

Um dos aspetos que carateriza o comportamento dos grandes órgãos da comunicação social em
Portugal, e mesmo de certos jornalistas, é o de promoverem personalidades de direita em grandes
autoridades sobre certas matérias para que depois as suas opiniões sejam aceites, pela opinião
pública, como verdades indiscutíveis. É um processo clássico de manipulação da opinião pública,
que Philippe Breton, professor na Universidade de Paris-Sorbonne, no seu livro “A Palavra
Manipulada” designa por “argumento de autoridade” Segundo este investigador, “este argumento
baseia-se na confiança depositada numa autoridade em nome do principio de que não podemos
verificar por nós próprios tudo quantos nos é apresentado” (2001:pág. 94). 

Tudo isto vem a propósito de Antonio Borges, conselheiro do governo para as privatizações, bem
pago com dinheiro dos contribuintes, que é simultaneamente também administrador da Jerónimo
Martins. A comunicação social afeta ao governo tem procurado fazer passar este “senhor”, junto
da opinião pública, como um grande professor de economia e um experiente gestor (formado na
escola da Goldman Sachs e do FMI). Por isso interessa analisar, até pela importância que ele tem
junto deste governo, a credibilidade técnica e cientifica das afirmações deste “senhor”,
nomeadamente as feitas no dia 29.9.2012; portanto, não é o aspeto se são ou não convenientes.

No I Fórum Empresarial do Algarve, em que participou, António Borges declarou à comunicação social que “a medida [Taxa Social Única (TSU)] é extremamente inteligente, acho que é. Os empresários que se
apresentaram contra a medida são completamente ignorantes, não passariam do primeiro ano do meu curso
na universidade” e, a propósito de baixar os salários nominais, que “as despesas com trabalhadores na
Administração Pública representavam 80% das despesas Totais” (RTP, 29.9.2012). A primeira afirmação (ofender os patrões) provocou grande alarido na comunicação social, mas a segunda (ofender os
trabalhadores) não causou qualquer reação, apesar de ser mentira e ser repetida pelo patrão da Jerónimo
Martins no dia seguinte nas declarações que fez no Telejornal das 13H da RTP, passando como verdadeiras
e alimentando a campanha contra os trabalhadores da Função Pública. Por isso, iremos começar por elas.
 

ANTÓNIO BORGES É UM IGNORANTE E MENTIU DESCARADAMENTE QUANDO AFIRMOU QUE A DESPESA COM PESSOAL NA ADMINISTRAÇÃO PUBLICA ERA 80% DA DESPESA TOTAL
O quadro 1, construído com dados constantes do Relatório que acompanhou a proposta de
Orçamento do Estado para 2012 elaborado pelo atual governo. portanto dados oficiais, mostra que
António Borges mentiu descaradamente quando afirmou que as despesas com Pessoal na
Administração Pública representam 80% da despesa total

Quadro 1 – Despesa Total e Despesa com Pessoal nas Administrações Públicas – 2010/2012
DESIGNAÇÃO
2010 2011 2012
Milhões de euros
I - TODAS AS ADIMINISTRAÇÃO PÚBLICAS 
(Central, Local e Regional)
  
1-DESPESA TOTAL DAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS 88.680,4 84.430,8 79.667,2
2-Despesa Pessoal das Administrações Públicas 21.093,0 19.858,9 16.929,9
3- Despesas de Pessoal em % da Despesa Total
23,8% 23,5% 21,3%
II- APENAS ESTADO (Administração Central)
  
1-DESPESA TOTAL DAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS
50.556,2 49.607,5 46.689,4
2-Despesa Pessoal do Estado (Administração Central)
11.383,3 10.485,3 8.766,5
3-Remunerações certas e permanentes
8.445,3 8.031,2 6.792,0
4-Despesas de Pessoal em % da Despesa Total
22,5% 21,1% 18,8%
5-Remunerações certas e permanentes em % da Despesa Total
16,7% 16,2% 14,5%
FONTE : Relatório da Proposta de Orçamento do Estado para 2012, págs. 55 e 72 - Ministério das Finanças

As despesas com Pessoal nas Administrações Públicas (Central, Local e Regional) representam,
em 2012, 21,3% das Despesas Totais das Administrações Públicas em Portugal, segundo dados
do próprio Ministério das Finanças, e não 80% como afirmou António Borges, Em relação ao
Estado, ou seja, a Administração Central, as despesas com Pessoal representam, em 2012,
apenas 18,8% da Despesa Total. Se a analise for feita  às “Remunerações certas e permanentes”
conclui-se que, em 2012, as remunerações na Administração Central (Estado) representam
apenas 14,5% das despesas totais do Estado. António Borges ao afirmar que elas representavam
80% revela ignorância total, e mostra que não conhece nem estuda minimamente os assuntos de
que fala, estando mais interessado em utilizar a mentira na campanha contra os trabalhadores da
Administração Pública com o objetivo de justificar os ataques do governo ao seus direitos e às
suas condições de vida. São personalidades deste tipo, com este estofo técnico e ético, que certa
comunicação social e certos jornalistas promovem a grandes autoridades.
Eugénio Rosa – Economista – Este e outros estudos disponíveis em www.eugeniorosa.com
António Borges é um ignorante arrogante formado na escola da Goldman Sachs e do   FMI                              

A DESCIDA DAS CONTRIBUIÇÕES PATRONAIS PARA A SEGURANÇA SOCIAL NÃO ERA “UMA
MEDIDA EXTREMAMENTE INTELEGENTE” COMO AFIRMOU ANTÓNIO BORGES

Se António Borges estudasse minimamente os assuntos de que fala, concluiria também que a
diminuição da TSU (Taxa Social Única) paga pelas empresas para a Segurança Social não era
uma medida inteligente, pois não teria quaisquer efeitos na competitividade das empresas,
determinando apenas a transferência direta de 2.200 milhões € dos bolsos dos trabalhadores para
os bolsos dos patrões, reduzindo a procura agregada, o que agravaria a situação económica e
financeira de centenas de milhares de empresas que vivem do mercado interno. E para concluir
isso bastaria que analisasse a estrutura de custos das empresas portuguesas. O quadro 2,
construído com dados divulgados pelo INE sobre a estrutura de custos das empresas não
financeiras em Portugal mostra, de uma forma quantificada, os reduzidos efeitos de tal medida.

Quadro 2 – Estrutura de custos das empresas não financeiras, e redução de custos determinada por
uma redução de 5,7 pontos percentuais nas contribuições das empresas para a Segurança Social
2008 2009 2010
RÚBRICAS
Em milhares de euros
CUSTOS TOTAIS EMPRESAS NÃO FINANCEIRAS (1+2) 208.397.995 188.117.253 207.577.366
1-Consumos intermédios
159.070.540 139.138.519 155.345.374
dos quais:
     
   Matérias consumidas
71.207.554 56.141.942  
   Fornecimentos e serviços externos
85.793.110 81.180.921  
2-Custos com o pessoal
49.327.455 48.978.734 52.231.992
   Remunerações
38.421.950 38.131.487 40.544.335
   Encargos sociais
10.905.505 10.847.247 11.687.657
3-Redução de 5,75 p.p. na TSU (5,75% das
Remunerações)
2.209.262 2.192.561 2.331.299
CUSTOS TOTAIS DAS EMPRESAS  sem 5,75 p.p. TSU 206.188.733 185.924.692 205.246.067
REDUÇÃO PERCENTUAL DOS CUSTOS TOTAIS COM
REDUÇÃO DE 5,75 PONTOS PERCENTUAIS NA TSU
DOS PATRÕES
FONTE: Empresas 2009 e 2010 - INE

-1,1% -1,2% -1,1%
Se António Borges conhecesse a estrutura de custos das empresas não financeiras portuguesas
saberia que uma redução de 5,75 pontos percentuais na taxa de contribuições patronais para a
Segurança Social (passar de 23,75% para 18%) provocaria uma redução de apenas 1,1% nos
custos totais das empresas portuguesas. Mesmo entrando com efeitos indiretos, a redução situarse,
para as empresas exportadoras, entre1,5% e 2,4%(depende do setor), segundo cálculos que fizemos utilizando os dados de um estudo divulgado pelo próprio governo em 2011. É evidente
para todos os leitores, que não seria com tal medida que se aumentaria a competitividade das
empresas portuguesas. E isto porque, por um lado, tal redução de custos é irrisória e ridícula e,
por outro lado, é facilmente anulada com qualquer variação positiva (apreciação) da taxa de
câmbio do euro. Por ex., entre 30 de Agosto e 12 de Setembro de 2012, o euro valorizou-se em
2,3% em relação ao dólar, o que seria mais que suficiente para anular aquela redução de custos.
A única justificação que encontramos  para as afirmações de António Borges ao chamar
ignorantes os empresários que se opuseram à baixa da TSU das empresas à custa do aumento
dos descontos pagos pelos trabalhadores, é que eles poderiam meter no bolso assim, com a ajuda
do próprio governo, 2.200 milhões € aumentando os seus lucros, e não quiseram. No entanto,
António Borges, se tivesse alguns conhecimentos consistentes de economia portuguesa
certamente saberia que mais uma redução da procura interna, quando a maioria das empresas já
não conseguem vender o pouco que produzem, teria consequências dramáticas no tecido
empresarial português, lançando muitos milhares de empresas na falência e fazendo aumentar
ainda mais o desemprego, o que determinaria uma maior contração do mercado interno. Mas esta
“economista”, formado na escola da Goldman Sachs e do FMI, transformado por certa
comunicação social em “guru”, parece não conhecer este principio elementar da economia.

Utilizando as próprias palavras de Antonio Borges, podia-se dizer com propriedade que seria o
próprio António Borges que “não passaria no 1º ano de um curso de economia da universidade”.
No entanto, as afirmações de António Borges tem o mérito, como consequência da sua
ingenuidade, de expressar publicamente, tornando assim claros para a opinião pública, os
objetivos e credibilidade técnica deste governo e desta maioria PSD/CDS.

Eugénio Rosa
Economista,
edr2@netcabo.pt , 30 de Setembro de 2012
Eugénio Rosa – Economista – Este e outros estudos disponíveis em www.eugeniorosa.com
 

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