quarta-feira, 31 de julho de 2013

José Afonso interpreta uma canção popular de Malpica na Beira Baixa. Uma canção das ceifas do pão.

Oh Que Calma Vai Caindo

Oh! que calma vai caindo
Sobre las gentes do campo
Meu amor que po lá anda
Encosta-te ao lírio branco


Andando eu a "ceifari"
Nas ladeiras do "Ponsuli"
Não me venhas a "lembrari"
Menina da saia "azuli"


A rola se vai queixando
Que lhe roubaram os ovos
Naõ os puseras tu rola
Tanto ao pé dos meus olhos


Por cima ceifa-se o trigo
Por baixo fica o restolho
Menina não se enamore
De rapaz que embisga o olho


Já se está o sol a "pôri"
Para trás do cabecinho
Bem quisera o nosso amo
Prendê-lo com um baracinho




Edna da Ilha de Moçambique.



domingo, 28 de julho de 2013

sábado, 20 de julho de 2013

Triple-sec que cheirinho a laranja! Um brinde à pouca saúde da nossa economia e da nossa existência como país independente!... Até caírmos redondos no chão!

O "triple-sec" é uma bebida muito alcoólica e licorosa com sabor a laranja. O travo amargo e perfumado da laranja, que o caracteriza é obtido pela mistura de cascas de laranjas amargas e doces que se fizeram macerar em aguardente e se levaram a um alambique para destilação. A cada destilação o grau alcoólico sobe até que à terceira deve chegar a 40º. O triple-sec é utilizado em misturas com outras bebidas para as aromatizar e aumentar o teor alcoólico.

LxCRAS - Centro de Recuperação de Animais Silvestres de Lisboa - Um belo filme sobre uma outra Lisboa.


sexta-feira, 19 de julho de 2013

necessáriamente esperam


banco alimentar



A vizinha Fátima que está desempregada e tem os filhos desempregados vai uma vez por mês ao apoio alimentar de uma das Igrejas da Freguesia.
Há vários bancos alimentares activos: O da Igreja Católica, o da Igreja Evangélica, o da Associação de Reformados e Idosos, o da Associação Humanitária de Bombeiros... São numerosos. Talvez por ser um concelho empobrecido depois que fecharam umas atrás das outras as pequenas indústrias que lhe davam vida e a azáfama de formigueiro.
À Fátima enchem-lhe o carrinho de compras com massa, arroz, latas de salsichas, às vezes latas de sardinha, margarina para barrar o pão, margarina para cozinhar, óleo, sacos com uns grânulos de aspecto plástico a que chamam cereais estufados de pequeno-almoço, leite de longa duração, e uns iogurtes que não necessitam de refrigeração. Estes três últimos produtos são-lhe fornecidos porque tem uma neta adolescente e  uma bisneta bebé. Foi o que explicou a vizinha Fátima que dispensa alguns dos cereais à Lurdes do prédio gavêto que também queria receber leite e iogurtes e lhe disseram já não ter idade com 66 anos. Além disso o agregado familiar, que é só ela, não tem miúdos. 
A Anunciação do prédio da oficina acha que a ajuda alimentar que lhe oferecem é um cabaz com o mais barato da mercearia. A cunhada, a Piedade, que nunca concorda com nada que ela diga, afirma que é melhor receberem aquelas coisas do que não receberem nada, e que o que gastariam a comprar aquela ajuda, poupam, e assim sobra para comprar outra coisa. 
O homem da Rosário, a filha da Piedade, que é um pisco a comer arranjou solução para os cereais de pequeno-almoço e para o arroz que em casa não davam vencimento a comer. Comprou "pitos" na Feira das Galinheiras e vende os frangos já na engorda. As frangas guarda-as para ele, para porem ovos e sempre fica com dinheiro para o copito e para o tabaco. "E os frangos não se queixam do prazo de validade dos cereais." Diz ele.
A vizinha Fátima diz que homem da Conceição e o da Carmo do prédio do alfaiate é que fizeram bem, apanharam um terreno à sociedade e vá de cavar. Toca a cultivar. Tomates não lhes faltam. E abóbora para a sogra.
"Já não posso ver sopa de mogango" já ouvi eu protestar a velha pacense que na infância perdera a paciência e o gosto, à custa de comer quase diáriamente grão-de-bico e sopa de abóbora. A Augusta que enviuvara cedo e que cuidara até à morte do pai que cegara dos diabetes no fim da meia-idade tivera agora que abrir a sua casa para recolher as filhas, os genros e os netos que perderam as suas casinhas no incumprimento das prestações ao banco.
A sua reforma pequena e o complemento de viuvez que o seguro lhe paga desde que o marido morreu de uma pedra arremessada por um tiro de dinamite com que cortavam a estrada para o Algarve mal chega para comprar o que o banco alimentar não previu nas suas necessidades e ainda a conta da água, a conta do gás, a conta da electricidade. 


A porta da igreja entreabre-se, ficará apenas meia-folha aberta. Só entram três pessoas de cada vez. A longa fila que antes se formava agora é mais concisa as pessoas chegam com hora marcada a “janela de oportunidade”. O sol nas matinais 10 horas de Julho pode ser castigador. Poupam-se assim os assistidos de se quedarem à torreira, e poupam-se as doutoras e as técnicas de assistência social da responsabilidade de alguma insolação, desidratação ou desmaio por hipoglicemia na fila de espera.
Cruzo-me com aquelas pessoas que esperam ali necessáriamente quando venho da praça onde fui abastecer-me.
Comprei alface lisa e tomate cereja que é o que a Ana e Maria, a sua filha de um ano mais gostam. A vendedora assegurou-me que a sua fornecedora não usa pesticidas na produção.
Comprei um garrafão de vinho para o senhor José que já não pode carregar com ele e com as muletas.
Comprei 1 litro de aguardente para o senhor Manuel que foi proibido de beber aguardente pelo médico há mais de 10 anos e que já não a pode comprar por não lhe chegar o dinheiro. É um hábito antigo do senhor Manuel que o adquiriu quando construía viadutos e túneis. Com um copinho de aguardente combatia o frio noturno, serenava o medo das alturas, e vencia o terror de morrer subterrado quando ao fim de 12 horas de trabalho se deitava numa tábua sobre o rio de drenagem do lençol freático. O senhor Manuel tem 89 anos e em tempos emprestou-me dinheiro quando eu tinha salários em atraso.
Comprei também carapaus para a prima Hortense porque a praça fica longe para ela poder ir a pé. A prima Hortense é prima do senhor José. Ela gosta muito de carapaus fritos e lá em casa nem as espinhas sobram.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Pobres de nós gordos que somos a nova imagem da fome.



A fome, toda a gente sabe, era uma coisa de tempos antigos, uma consequência de grandes catástrofes ou de um acidente maior como a guerra.

A fome contemporânea, essa dava notícia de terras remotas onde o empenhamento em chegar lá era menor do que ir até à Lua. Terras perdidas nos confins de África ou da Ásia. Desconhecidas e desérticas, onde chegavam carros de rali e bombardeiros mas não os sacos de sementes nem os engenhos de furar poços que dessem água limpa ou o conhecimento para fazer represas e cisternas que guardassem a água quando houvesse chuva.

A fome andava a par com a pobreza e precedia a doença nesse cortejo apocalíptico cuja personagem derradeira é a morte. A fome era persistente e quotidiana. Era imaterial e volátil. Cada dia pesava menos na balança...
 Mas tudo muda.


A fome agora é diferente. A fome saiu dos locais onde andou proscrita e agora senta-se entre nós. A fome agora é obesa todos pensam que é abundância mas não passa de fartura feita de míngua, de escassez do que é essencial. A fome senta-se à frente de um prato de massa com molho de tomate e farta-se como um viciado que perde a razão, como se não houvesse amanhã, como só restásse comer e esperar a morte. 
A fome neste pobre mundo rico instalou-se na calote norte e dormita inerme na sua obesidade. 
Não basta mais aos ilustradores apocalípticos representar a fome como um ser esquelético, andrajoso e decadente, a fome agora bem pode ser o retrato de um ser jovem, hiper-sensível e extremamente obeso.