domingo, 29 de outubro de 2017

A arte é a linguagem da incomunicabilidade.

Tomar para mim o conselho que dou aos outros:
-Desenhar em bom papel.

Na mesa do almoço deixáste um desenho tão bom  na toalha de papel. Aqui em casa sobre papel bom desenhas isto. O que é isto?

























Quando o pensamento é remoto e por momentos não vivemos a percepção presente mas a da memória, o desenho volta infantil, coevo com a memória na sua aparência, mas marcado por um transe que só pode vir do futuro, que é o presente que a memória não deveria ainda conhecer.




Remetente: -É arte bruta!
Destinatário: -Arte bruta o caralho!
Remetente: -!?
Destinatário: -Vai mas é chamar bruta a quem te pariu.



Arte Bruta: 

Expressão traduzida a partir da língua francesa, criada por Jean Dubuffet :“Art Brut”.
A tradução verte para português as palavras art brut que originalmente queriam significar arte crua. Em português soa mal tal expressão, uma vez que este tipo de arte, até então nem sequer reconhecida como arte, era produzido por pessoas internadas em hospitais ditos psiquiátricos. O local onde se exilam e asilam os brutos, os alienados.
Internadas e enclausuradas alegadamente por padecerem de doenças mentais ou simplesmente por serem refractários à moralidade ou ao comportamento social dominante muitas destas pessoas produziram aquilo que o espírito humano sempre produz a partir do seu âmago: Arte. A falta de sistema referencial que validásse esta arte como tal, nestes locais tão desolados e desoladores, alguns deles verdadeiros campos de concentração, terá provocado em Dubuffet o desejo da sua recuperação e reconhecimento como tal.
Esta arte primordial livre de influências de escolas ou academias é uma arte feita espontaneamente e brota como as nascentes. À semelhança das nascentes os vendilhões do templo tudo transformam em mercadoria. À apropriação que fazem e à corrupção que provocam chamam criação de valor e assim a esta nascente logo trataram de a encanar, engarrafar e distribuir pelos mercados do costume criando valor. Os artistas? Bem, é o que se sabe.


 

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Lluís Llach - Damunt D'Una Terra. Lá pelo ano de 1977 aprendi todas as canções de Lluis Llac de um disco gravado em Barcelona após a queda da ditadura fascista espanhola. Todas aquelas canções me parecem hoje hinos de antecipação à situação que se arrastou desde o séc. XVII, até hoje. Foram hinos para um dia de esperança que chegou. Tal como em 1640 hoje há um Filipe na cadeira.

L´estaca - Lluis Llach. 1.976, Palau dels esports de Barcelona

Lluís Llach canta l'estaca - 20/07/2017 -

Els Segadors - Le chant des Faucheurs, hymne national de la Catalogne

"PARE I AMIC" Cobla Bisbal Jove

Symphonic Sardana - Catalonia

Sardana "La santa espina"

Do Turkmenistão Gasan Mamedov e o seu conjunto.

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Pavel Grigorievich Chesnokov nasceu neste dia em 1877.Nesta composição pode ser ouvida a voz de um baixo profundo. Uma voz especial que na música da tradição russa é muito frequente.

"Não me rejeites na velhice"

 Não me rejeites na velhice
 quando não me restarem forças
 não Te esqueças de mim
 agora que os inimigos conspiram
 com os que esperam emboscar minha alma 
 dizendo: "Deus o abandonou
 persigam-no e apanhem-no,
 pois não há quem lhe valha"
 Oh meu Deus não Te afastes de mim
 Oh meu Deus urge a Tua ajuda
 para que os que de desonram a minha alma
 sofram a vergonha e a consumição  
 porque eu Ti confiarei sempre
 e eternamente Te louvarei.


sábado, 21 de outubro de 2017

O que me ensinaram os que sobreviveram aos fogos.

Nestes dias em que apressadamente aqui e ali estendem o microfone rápido aos que sobreviveram ao lume, muito tenho aprendido. 

Fiquei a saber que quando se foge por uma estrada ladeada de árvores de combustão rápida como os eucaliptos e os pinheiros há um risco acrescido de morte por não se conseguir chegar a campo aberto e seguro.

Uma vez dentro de uma viatura em fuga e rodeado por chamas, é bem provável que o caminho deixe de se ver por causa do fumo, como se caísse um nevoeiro denso e a cerração não deixásse ver mais que um metro ou dois de distância. Por mais familiar que o caminho seja a desorientação é muito provável.

Este fumo que sufoca e faz arder os olhos, provoca lágrimas que toldam ainda mais a visão. A temperatura, a falta de oxigénio e a desidratação rápida, colocam o cérebro em modo de sobrevivência. Nesse estado as decisões são instintivas. Só um treino anterior pode preparar alguém para  contra-intuitivamente e em automatismo, reagir de uma determinada maneira. Por exemplo atravessar as labaredas de uma parede de lume.

Se o caminho de fuga estiver obstruído por viaturas imobilizadas, por ramagens ou árvores que caíram e se se avistar uma brecha para poder fugir a pé; é provável que a porta da viatura não se consiga abrir. Nos carros mais antigos a chapa e os componentes metálicos aquecem e dilatam. Nas viaturas mais recentes os componentes plásticos perdem tenacidade, tornam-se fluidos e fundem.

Se o fogo se aproximar de um povoado, a menos que o caminho de evacuação seja totalmente seguro, é melhor não fugir. É melhor encontrar um terreiro, um adro, um largo, uma praça e fazer um perímetro de arrefecimento. Com vasilhas cheias de água, de vinho, de líquidos neutros e incombustíveis, com eles regar tecidos grossos de fibras naturais, proteger o rosto e as mãos e auxiliar o próximo. Idealmente encontrar um tanque de lavagem ou de rega, uma cisterna, uma represa de água em que o corpo se possa mergulhar e manter arrefecido.

A dependência do fornecimento de energia eléctrica da rede para bombas ou motores de rega ou a dependência do abastecimento de água da rede pública pode ser fatal, porque pode falhar no momento de maior necessidade. 
Os cabos aéreos pegam fogo, os postes que os sustentam ardem e colapsam. As canalizações de água perdem a pressão e o caudal. As mais superficiais com o calor fundem e rompem.

Pedir auxílio pode não ser possível devido ao elevado número de comunicações em simultâneo. Os cabos de telecomunicações aéreas também incendeiam, assim como as antenas fixas.

Uma casa que tenha resistido às faúlhas e até às labaredas, devido ao aumento de temperatura das suas paredes, pode sofrer uma auto-ignição e entrar em combustão ardendo de dentro para fora. Assim me relataram que aconteceu em Tondela. 

A primeira vez que ouvi falar na auto-ignição de casas, foi pelo relato feito por uma habitante belga que há cem anos durante a Primeira Grande Guerra se lembrava de ter havido um ano particularmente sêco e de um verão com temperaturas elevadas a tal ponto que as casas de madeira em que viviam tiveram de ser molhadas para não entrarem em combustão espontânea. Agora fiquei sabendo que também pode acontecer nas casas de alvenaria mesmo após a avaliação dos bombeiros não ter detectado esse acidente em curso.

Quem poderá, a não sermos nós, guardar este precioso conhecimento? 
Como poderemos integrá-lo no nosso quotidiano de forma a ele fazer parte da nossa cultura? 
Como poderemos, de outra maneira, alhearmo-nos de uma cultura de segurança esperando outra catástrofe?
Não são só os fogos. São também as cheias, os sismos e o pior de tudo: A corrupção.






quarta-feira, 18 de outubro de 2017

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Os populares? Não senhores jornalistas!



Levam o tempo todo a aculturar, a alienar, a nivelar por baixo, a interromper a informação para ligar à conferência de imprensa do treinador de futebol, a abrir o noticiário com a lesão deste ou o golo do outro. Dirigem-se aos telespectadores tratando-os por “você” e depois referem-se aos concidadãos como sendo “os populares”. O termo parece inócuo mas não é!

Altaneiros e arrogantes, como titulares de alguma elite aristocrática, interrompendo quem se alimenta, importunando quem descansa, na essência são os arautos da conformidade e da conformação. São os colaboradores do conformismo e realmente fazem a notícia, acicatam, pedem cabeças, mas não formam nem informam.

Os populares não!
O povo, sim! Os vizinhos, sim! A população, sim! Os fregueses, os munícipes, os cidadãos, os voluntários sim! Sim! Sim, os que ajudam, os que auxiliam, os que cooperam, os que não são indiferentes, nem se alheiam.
Mas nem todos os jornalistas são maus, nem todos desejam bom dia a quem viu a casa arder, ou acabam de sorriso nos lábios após relatarem acrescido número na fatalidade dos incêndios. Há jornalistas que observam e descrevem o que vêem e fazem uma pergunta como esta que eu ouvi: “Como é possível uma zona industrial não ter instalado bocas-de-incêndio para que se possam usar no combate ao fogo?”






O problema agora já não é o fogo, o problema é a água.






Em Portugal o Terrorismo tem um nome próprio: Chama-se fogo posto.



















Os terroristas em Portugal têm um nome específico:
-Chamam-se incendiários!

Os fogos deste fim de semana com toda a destruição e morte que causaram tornaram claro que não é por haver vegetação que há fogo , que não é por haver mato sêco ou madeira acumulada que há incêndios. A chama necessita de alguém que a produza, alguém que risque um fósforo, alguém que maneje o isqueiro, alguém que forneça o isqueiro.



sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Gato dormindo.


LUX PLATEARUM - Calçada portuguesa de Ernesto Matos e António Correia.

Há um desapreço pelo pavimento tradicional. Continuo a pensar que a melhor maneira de moderar, diminuir, a velocidade dos veículos em meio urbano não é a construção de rotundas nem a colocação de lombas mas sim a utilização de calcetamento basáltico vulgarmente conhecido por macadame. Da mesma maneira para não haver escorregadelas, entorses nos tornozelos ou nos joelhos e tacões presos entre as pedras do vidraço o melhor não é pavimentar com betão, mas sim contratar calceteiros profissionais, desenvolver com as universidades máquinas que possam tornar o trabalho de assentamento menos penoso e mais veloz. Enquanto ainda há calçada portuguesa podemos usufruir da sua beleza e perceber o que representa na nossa tradição cultural. Estes livros como os outros do mesmo autor documentam essa riqueza que distraídos pisamos diáriamente.