sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

LAPIS uma exposição que "falará" da pedra e também de pedreiras que não existem (*)por isso falará também de Mauthausen.


Na imagem: Livro de apontamentos, por vezes chamam a este tipo de objecto livro de artista, sobre folha desenhada. Este tipo de desenho costuma ser chamado escrita. Trabalho para a exposição em preparação.

















(*) A expressão "que não existe" foi recolhida do poeta Joaquim Cardoso Dias que a utiliza, nomeadamente quando usa a fotografia como forma de poesia visual. 
Essa expressão aparentemente contraditória porque aparece ao lado de um registo material que é a fotografia. Parecendo até uma forma de ironia, reflecte sobre a própria natureza do que poderíamos chamar a prova. Também assume a suprema consciência da transitoriedade de tudo. O registo fotográfico do rio, a prova de que o rio existe, não constitui o mesmo rio que veremos se nele nos formos banhar. Menos ainda, será esse rio, se a fotografia ainda permanecer quando o rio já secou.










quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

LAPIS -Várias horas tem o dia e assim diferentes são as necessidades conforme a hora do dia. Exposição em obra, em obras, em andamento e em movimento retrógrado.




Várias horas tem o dia e assim diferentes são as necessidades conforme a hora do dia. Explicou-me um amador da pose que o fumar cachimbo conferia aos seus cultores. Contou-me ele que o facto dos fumadores de cachimbo utilizarem cachimbos diferentes ao longo do dia se devia à necessidade da quantidade de nicotina a absorver consoante a hora. Um cachimbo maior ao levantar para combater a privação da noite. Cachimbos mais pequenos para o dia para fumaças rápidas entre tarefas que não permitiam libertar as mãos, ou seja cachimbos leves que só se podem segurar com a mandíbula, mordendo. Cachimbos grandes para as tardes demoradas de Verão ou noites longas de Inverno em que ocupações como conversar, fazer a esplanada vendo quem passa, leitura, escrita etc. permitem segurar um cachimbo mais pesado com uma das mãos.
Assim também com os desenhos. Várias horas tem o dia e assim diferentes são as necessidades conforme a hora do dia. E há horas em que o cérebro e a mão não se entendem. 























Ergueram muros porque assim limpavam o chão de pedras e nele podiam semear Pão. Os muros também abrigavam da nortada e conservando calor guardavam da geada que ela trazia.



terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

LAPIS - exposição em andamento e a tempestade que se aproxima.


Fui convidado para uma exposição. 
As exposições são coisas de juventude. São quase como um blogue. Ter necessidade de mostrar o que se fez, o que se pode fazer; a facilidade que se tem de usar um formulário como um profissional competente, experiente e sensato que conhece técnicas e procedimentos; que aplica protocolos de qualidade e genuinidade.

Planear a disposição da exposição, "fazer o espalhamento", a limpeza de compor um espaço bonito para o qual se convidam os amigos, os amadores da arte, os possíveis compradores, os críticos...
Não tenho objectivos precisos. Uso a intuição. Arrisco o não previsível, o não intuitivo. Não discuto métodos de trabalho. A Maria João Pires terá dito que não há técnica. Acho que o que entendi do que ela queria dizer é que não é um procedimento que possibilita a comunicação de quem executa mas sim a capacidade de comunicar conseguindo executar. Independentemente das limitações ou apesar delas. Isso faz-se com trabalho e com um estado alterado de percepção em que o executante capta como uma antena e descodifica sinais simultâneamente gerando outros. Perguntas e respostas, ecos. 
No outro dia comprei um catálogo antigo de uma exposição de desenhos de muitos autores contemporâneos. Mostrei-o à Beatriz Cunha e disse-lhe que era para me lembrar da liberdade que o desenho representa uma vez que me sentia constrangido, emperrado. Ela disse-me que eu andava distraído. Aqueles desenhos que eu achava bons, eram na sua grande maioria maus. Descontextualizados do conjunto da exposição, sem o nome dos autores que os produziram eram maus. Talvez assim seja.
Há dias em que eu consigo desenhar... digamos, trinta desenhos; ou melhor dizendo, consigo desenhar por 6 ou 12 horas seguidas até me doerem os pulsos, os dedos e me arderem os olhos. Outros nada consigo executar. Então escrevo porque é para mim uma forma alternativa de fuga. Se eu estiver frente a uma paisagem é bem possível que não a desenhe, por outro lado se eu estiver  confinado, retido num local, acontece-me a necessidade de começar a desenhar. Se a paisagem estiver lá é bem possível então que eu a desenhe. 
O meu processo criativo não me leva à reprodução, à transposição da realidade exterior mas a uma forma de mergulho na realidade interior. Acontece-me uma criação ou recriação do que está para além do meio ambiente e aquém dele. Por isso eu digo que não há êrro. É nesse sentido que não há linha de contorno. Há linhas que aparecem e desaparecem, que se criam com o movimento, com o afastamento e a aproximação do olhar, com o espaço e o tempo. O risco ainda é risco quando o lápis já deixou para trás o seu bico partido ou quando já só a madeira que envolve a sua grafite continua a sulcar o papel e a deixar um rasto. A linha ainda é linha quando o pincel perdeu fora de sítio a gota excessiva inicial que o gesto da mão se esqueceu de escorrer na boca do tinteiro. E continua sendo linha quando já sem tinta o pincel se arrasta deixando intermitentemente as marcas da sua sede. E a mancha é tudo isso, numa espécie de "Kaos", que remete para a distância e para o afastamento. 
Os artistas insatisfeitos têm muitas vezes a sensação de não terem sido eles a fazer esta ou aquela peça, ainda que se lembrem de quando e como a fizeram. Acontece aí o afastamento de si mesmo, uma desapropriação, o desprendimento que constitui a essência da própria existência de tudo.







sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

O Livro de Isabel Hagos - As Cidades





         Há livros que não são para serem lidos
         São para serem ditos por quem sabe dizer.
São para serem ouvidos.
 “Os Lusíadas” assim são!
Há momentos que uma voz interior faz isso.
Alguém que amamos ouvir. A voz da amada.
A voz dos que amam os poemas, e a língua,
O João Villaret, O Mário Viegas,
A Carmen Dolores, O João Grosso,
Outros e Outros ainda...
Mas há livros que são tão torrenciais
que parecem o gorgolejar de uma artéria,
como se a carótida fosse golpeada
ou a femoral perfurada.
Há artérias e veias que são poemas e soam
às golfadas como as notas de uma folia,
uma cadência urbana, um pulsar sem tino.




LA FOLIA DOS ESTRELLAS LE SIGUEN - MANUEL MACHADO

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

LAPIS - exposição em construção. A Pedra-que-Abana.

Em Portugal, por todo o lado existem Pedras-que-Abanam.
São grandes rochedos de muitas toneladas que oscilam com um pequeno empurrar de mão. São curiosidades geológicas. As que conheço de origem granítica, são os vestígios do que não foi desfeito pela erosão da era glaciar, pela abrasão e erosão dos elementos. Algumas delas encontram-se em promontórios, à beira de grandes declives, aumentando essa impressão de fragilidade e de impermanência. O vacilar de um colosso perante um pequeno gesto. A queda eminente de um penedo medonho face a uma pequena força de alavanca faz com que estas pedras sejam de alguma maneira mágicas pela raridade do seu equilíbrio e pela simbologia que a sua situação nos suscita.