quarta-feira, 28 de outubro de 2020

A toalha de papel de uma mesa em Tomar.

























Tem que ser dito que o local se chama "Claustro".
É uma cervejaria que fica na Rua Serpa Pinto, 48 em Tomar.

Tem de ser dito que numa primeira visita, pelas três da tarde, quando vários restaurantes nada propuseram para nos restaurar, justificando terem a cozinha fechada, neste "Claustro" receberam-nos com simpatia.
Desta vez verificámos que a simpatia, a gentileza e a eficiência continuam a ser a face da casa.
A alimentação confeccionada é excelente: Migas com feijão e couve, raras de encontrar tão boas; choco frito num ponto tenro como é difícil encontrar mesmo em Setúbal; bacalhau óptimo e a cerveja à pressão Bohemia sem mácula.
Não, não é caro e ninguém parece ter ficado com a impressão de que a comida era pouca.
 

terça-feira, 27 de outubro de 2020

Depois de olhar as gárgulas fui almoçar.

 Na confusão da higienização. O pão vem agora dentro de uns saquinhos de papel. Por vezes são os talheres que vêm dentro de um saco de papel. Daqui a dias a máscara será obrigatória na via pública quando houver outras pessoas por perto. São tantas as contradições e os disparates que parece vivermos num mundo de gárgulas medonhas.

Aproveitei o saquinho do pão para fazer um boneco que vagamente é uma gárgula.




sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Vimeiro, salgueiro? -Não é um vimeiro mas lembrei-me deles.

 



Cortam as hastes que rebentam dos vimeiros. Com elas cintam molhos de grelos ou atam videiras. A flexibilidade do ramo recém-cortado comporta-se como uma corda ou um cabo de grande resistência.

Os vimeiros nascem onde há abundância de água e é natural encontrá-los junto aos rios. As suas raízes servem também para segurar os taludes das margens consolidando o percurso do leito.

Com os vimes é possível fazer toda a espécie de entrançado que vai desde os cêstos, aos móveis, e ao empalhamento de vasilhas.

A utilização dos vimes deve ser pré-histórica e encontra registo nas civilizações antigas desde a China à Bacia do Mediterrâneo. Os chineses antigos já ferviam ramos e folhas para curar feridas, o ácido acetilsalicílico que constitui a “aspirina” provém do salgueiro, daí o seu nome a partir do nome latino da planta Salix.

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

António Rosado toca os cinco concertos que Beethoven escreveu para piano.

A integral dos concertos para piano de Beethoven, será tocada pela segunda vez no teatro São Luiz, após a sua primeira apresentação no Teatro Luísa Todi de Setúbal.
É uma empreitada gigante que se desenvolve ao longo de tês dias.
De alguma maneira descreve a construção mental envolvida na transposição do Beethoven de um período convencinalmente apelidado clássico para o Beethoven do período romântico.
Beethoven encarna uma revolução mas ao contrário do final habitual das revoluções -Cada Revolução termina com o seu Napoleão- quando ouço os quartetos de cordas ainda sinto que é música contemporânea. Beethoven ainda é a transformação do espírito, e a esperança.

António Rosado é um trabalhador incansável o seu repertório assim o demonstra por se estender por tantos compositores e abranger tantas épocas diferentes. Toca o que os especialistas consideram ser o mais árduo de ser tocado. Toca forte o que deve soar forte, mas o que é verdadeiramente mais difícil, consegue tocar delicada e suavemente o murmúrio das notas que devem ser apenas sussurradas como um segredo que se transmite ao ouvido.




segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Viva a Républica! Republica digo.


Letra: Henrique Lopes de Mendonça Música: Alfredo Keil
Data: 1890 (com alterações de 1957)


Orquestra Sinfónica Portuguesa; Coro do Teatro Nacional de São Carlos; Elisabete Matos, soprano e direcção de João Paulo Santos.




domingo, 4 de outubro de 2020

Ai hoje é o dia do animal?!


 



Amo o Porto!

 


Amo o Porto!

 Agora diz-se amo, em vez de gosto, como se amar fosse coisa banal. Num mundo tão carente de amor é compreensível que assim se utilizem as palavras sem que se pense muito nos conceitos que implicam. O grau com que se exprime o apreço por um pão com fiambre é o mesmo com que se descreve a ligação a uma pessoa ou à terra natal.

Mas à parte desta consideração sempre amei o Porto. O primeiro despertar para este sentimento deu-se devido à beleza de uma aguarela que mostrava o Douro sobre a Ponte D. Luís. Depois a ligação foi intensificada por causa de um filme que correndo imagens a uma velocidade estonteante provocou em mim uma espécie de exaltação. O filme era do Manoel de Oliveira e chama-se “Douro, faina fluvial”.

A primeira vez que cheguei ao Porto tinha 13 anos. Vim numa camioneta que me trouxe de Cinfães até uma garagem da qual se avistava a Torre dos Clérigos no topo da rua.

Nessa primeira visita, a chegada foi pela hora do almoço que ía já avançada, a velha camioneta de carreira trouxera-nos com algum atraso para o que íamos fazer. Almoçámos ali ao lado da garagem numa bela casa de pasto. Perguntámos que comida estava feita e pronta a servir. –Tripas… Sim! Disse eu. À moda do Porto, é claro! A minha surpresa foi grande e a expectativa gorada. Afinal a refeição de nome exótico era o que a minha mãe cozinhava em casa chamando-lhe dobrada, ou com mais detalhe, dobrada com feijão branco para a distinguir da dobrada com molho de tomate.

O almoço foi pago com uma nota de cem escudos que tinha no rosto a efígie do Camilo Castelo Branco e no verso uma magnífica gravura com a legenda “Porto meados do século XIX”. A extraordinária gravura penso que mostra a Rua do Loureiro, e apesar da miniatura da sua dimensão captava a atmosfera dos dias soalheiros que acordam com uma neblina matinal que só se encontra nas cidades ribeirinhas junto ao mar. Esta gravura, enquanto a nota existiu em circulação, foi como uma janela aberta no meu imaginário para uma cidade fantástica a que só muito mais tarde voltaria e em que pouco permaneci, devido a visitas rápidas por algum motivo específico. (1)




Desta vez que me pude demorar mais no Porto também cheguei pela hora do almoço. Ao estacionar, avistei do outro lado da rua a “Rosa das Iscas”. Na lousa dos pratos do dia estava gizado “Tripas à Moda do Porto”. E assim foi! Guloso, ainda perguntei pelas Iscas. Mas o jovem simpático respondeu-me que não. Que isso era noutro tempo. Mas como é possível uma casa que tem o nome Rosa das Iscas não ter iscas? Não é possível. Por isso imaginei que ele estivesse a brincar comigo.

Encriptamento e subjectividade à parte, nos dias de hoje ao Fernando Pessoa, ou melhor dito, ao Álvaro de Campos não lhe serviriam “Dobrada à Moda do Porto” fria (2). Tal como não me serviram a mim. Mas cheguei à conclusão que se quiser comer uma boa dobrada terei de ser eu a cozinhar como aprendi com a minha mãe. Receitas há muitas: Tripas; Tripas à Moda do Porto; Dobrada com feijão branco, etc. parecendo variações do mesmo, são comida diferente, mas isso é outro assunto.




 

 

 

 

(1)    Sei agora graças ao trabalho de Maria Teresa Nogueira de Morais da Cruz Pinho “Luís Filipe de Abreu e o desenho das notas de escudo do Banco de Portugal” que a maquete inicial foi a de João de Sousa Araújo sobre uma vista da cidade do Porto, nos meados do século XIX, litografia de Louis Haghe, com desenho de George Vivian. A imagem escolhida para ser reproduzida na vinheta desta nota, tem o título “O Porto visto do Convento de freiras de S. Bento”.

 

(2)   Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,
Serviram-me o amor como dobrada fria.
Disse delicadamente ao missionário da cozinha
Que a preferia quente,
Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria.

Impacientaram-se comigo.
Nunca se pode ter razão, nem num restaurante.
Não comi, não pedi outra coisa, paguei a conta,
E vim passear para toda a rua.

Quem sabe o que isto quer dizer?
Eu não sei, e foi comigo ...

(Sei muito bem que na infância de toda a gente houve um jardim,
Particular ou público, ou do vizinho.
Sei muito bem que brincarmos era o dono dele.
E que a tristeza é de hoje).

Sei isso muitas vezes,
Mas, se eu pedi amor, porque é que me trouxeram
Dobrada à moda do Porto fria?
Não é prato que se possa comer frio,
Mas trouxeram-mo frio.
Não me queixei, mas estava frio,
Nunca se pode comer frio, mas veio frio.

Dobrada à Moda do Porto

Álvaro de Campos - Fernando Pessoa