quarta-feira, 31 de maio de 2017
terça-feira, 30 de maio de 2017
domingo, 28 de maio de 2017
Quando os anjos cantam soam assim como Pyotr Ilyich Tchaikovsky os ouviu. Devemos-lhe esta vontade de partilha para que também soubéssemos.
Toda a beleza começa por ser espiritual; intangível como o som e o silêncio.
sábado, 27 de maio de 2017
sexta-feira, 26 de maio de 2017
Azulejo no leilão.
Há dias descobri que um azulejo meu tinha sido vendido num leilão. Pintei-o no ano de 2001. Nele escrevi um rol de perguntas. Não me parece hoje que sejam perguntas a que se tenha de dar resposta.
Em que pensas quando não pensas em Nada?
Vês o azul ou só o silêncio ecoa dentro de ti?
Sentes o tempo ou és tu o tempo sem começo ou fim?
És tu ainda?
Em que pensas quando não pensas em Nada?
Vês o azul ou só o silêncio ecoa dentro de ti?
Sentes o tempo ou és tu o tempo sem começo ou fim?
És tu ainda?
quinta-feira, 25 de maio de 2017
segunda-feira, 22 de maio de 2017
sexta-feira, 19 de maio de 2017
quarta-feira, 17 de maio de 2017
segunda-feira, 15 de maio de 2017
domingo, 14 de maio de 2017
sábado, 13 de maio de 2017
sexta-feira, 12 de maio de 2017
quinta-feira, 11 de maio de 2017
O medo e a máscara.
Representando uma espécie de transparência, como numa radiografia, desenhei de memória a figura de um gigantone, de maneira a ser possível ver no interior o seu carregador.
A primeira vez que vi estas figuras, foi em criança num desfile carnavalesco. Era muito pequeno e não terei percebido logo que aquela aterradora figura gigante era uma paródia que tinha no seu interior uma pessoa que a transportava.
Foi com espanto que vi surgir uma abertura até aí coberta por um véu negro, e através dela aparecer um olhar escrutinador. Até hoje tenho viva essa sensação de surpresa e de alguma forma revivo a mesma emoção sempre que ocorre alguma revelação e percebo alguma coisa nova. Há vezes que descubro o que todos sabem, outras o que muitos sabem. Mas há outras que descubro o que ainda ninguém tinha percebido.
Agora durante um daqueles períodos em que estava a olhar para o quadradinho em branco sem assunto para pintar, desfolhei o livro de apontamentos onde tinha desenhado inicialmente aqueles bonecos e retomei o olhar desenhando no azulejo com o pincel.
A chacota não resistiu à sua segunda queima e cindiu a minha intenção de retomar esse olhar.
O olhar que pintei no azulejo não é o olhar de quem olha para fora. Talvez seja antes o olhar de quem no exterior toma consciência do que está no âmago daquilo que teme. Talvez seja o olhar da perda de inocência.
quarta-feira, 10 de maio de 2017
terça-feira, 9 de maio de 2017
segunda-feira, 8 de maio de 2017
Azulejo avulso e Azulejo de figura avulsa.
Os azulejos avulsos são aqueles que fazem parte de um, ou de vários painéis de dimensões desconhecidas.
Independentemente da sua leitura ser prejudicada, é por vezes possível ela poder ser ainda apreendida se o azulejo identificar um detalhe que consiga ainda ter expressão sem o resto do conjunto. É o caso de detalhes florais, do rosto de querubins, ou de azulejos de repetição. Na maioria das vezes estes azulejos acabam por não mostrar figura, ou padrão identificável e só são salvos das montureiras de entulho porque correspondem à dimensão necessária para colmatar alguma falha de azulejos em outro painel, prevenindo a ruína ou a depredação dos ainda expostos.
Azulejos de figura avulsa, são azulejos que apresentam uma imagem integral, que vive autónoma.
Seja a sua narrativa um discurso compreensível ou não. Seja ela ilustração de história feita ou de episódio por contar.
ou têm marcas de limitação que os pode relacionar com outro azulejo idêntico que seja posto lado a lado,
ou exibem algum tipo de marcação ou assinatura.
Ainda assim há azulejos que não se revelam se pertencem a algo maior que o que a sua quadratura parece mostrar.
domingo, 7 de maio de 2017
Azulejos - A surpresa da fornada. A noite
Quando os azulejos entram na mufla para lá passarem doze horas, cozendo a pintura feita no seu vidrado, abre-se um período de expectativa semelhante ao que nos acontece quando a noite cai.
Quem já passou a noite longe dos meios de iluminação disponíveis nas cidades contemporâneas, terá ideia da limitação que o breu nocturno impõe às tarefas que na luz do dia são simples de executar.
Mesmo psicológicamente essa impossibilidade de ver a distância parece limitar a capacidade de planeamento, antevisão e boa esperança. Quem se sente doente piora sempre com a noite.
Por alguma razão de protecção evolutiva o nosso sistema vital abranda e adormece. É essa necessidade de descanso que parece transmitir a sensação de infortúnio eminente que para uns se traduz em insónia, o medo de dormir e não acordar; enquanto para outros, os que não suportam a ansiedade da espera, o adormecimento é rápido e profundo.
Com a aurora tudo volta a ser.
Algumas
coisas porém deixam de ser o que aparentavam, pois tal como alguns
azulejos que saem da mufla, verificamos que perderam a sua integridade.
.
Quem já passou a noite longe dos meios de iluminação disponíveis nas cidades contemporâneas, terá ideia da limitação que o breu nocturno impõe às tarefas que na luz do dia são simples de executar.
Mesmo psicológicamente essa impossibilidade de ver a distância parece limitar a capacidade de planeamento, antevisão e boa esperança. Quem se sente doente piora sempre com a noite.
Por alguma razão de protecção evolutiva o nosso sistema vital abranda e adormece. É essa necessidade de descanso que parece transmitir a sensação de infortúnio eminente que para uns se traduz em insónia, o medo de dormir e não acordar; enquanto para outros, os que não suportam a ansiedade da espera, o adormecimento é rápido e profundo.
Com a aurora tudo volta a ser.
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sábado, 6 de maio de 2017
Isto dos Dias, de haver dias com dedicatória; não deixa de ser uma espécie de condomínio fechado. Por mais belo que seja o jardim, por maior espaço que tenha a sua tapada. Não deixa de ser um reduto, um espaço limitado de defesa contra incendiários e madeiradores. A prisão é por vezes oferecida como uma forma evoluída de liberdade. Da mesma maneira os dias disto ou daquilo nada jubilam e tudo o que festejam é a precaridade da efeméride ou do seu tema. Não nos podemos esquecer que ainda há pouco tempo um governo maléfico acabou de uma só vez com a comemoração generalizada e oficial de quatro destes dias que julgávamos como certos.
quarta-feira, 3 de maio de 2017
Early In The Mornin' - Uma canção de trabalho dos homens que estavam presos numa tal Parchman Farm pelos anos de 1947, 1948. É um ritmo que marca o lançamento do machado quando cortavam grandes árvores para desbaste da mata. Foram gravadas por um dos etnomusicólogos americanos de referência em todo o mundo chamado Alan Lomax.
segunda-feira, 1 de maio de 2017
Catarse (versão corrigida 2017)
Pelo ano de 1983 entre Abril e Maio, escrevi um texto vagamente poético que relatava a sensibilidade face à minha condição de operário metalúrgico. Sem saber estava a escrever uma elegia a um mundo em desaparecimento uma vez que tinha sido decidido acabar em Portugal com o alto-forno (1), e subsequentemente com a metalurgia e a construção naval. Apostava-se mais na importação de partes para montagem do que na industrialização de raiz com fabrico a partir da matéria prima.
A modernização tecnológica posterior acabou com as máquinas electromecânicas e semielectrónicas com que eu trabalhei e aquele hipocausto mudou para o outro lado do mundo.
O texto esteve perdido durante anos até agora. Fiz-lhe algumas correcções, e aqui o deixo com a ilustração de um pequeno painel de quatro azulejos, que pintei de memória, 20 anos depois em 2003.
(1) (As palavars não são minhas mas sim do insuspeito António Champalimaud.)
A modernização tecnológica posterior acabou com as máquinas electromecânicas e semielectrónicas com que eu trabalhei e aquele hipocausto mudou para o outro lado do mundo.
O texto esteve perdido durante anos até agora. Fiz-lhe algumas correcções, e aqui o deixo com a ilustração de um pequeno painel de quatro azulejos, que pintei de memória, 20 anos depois em 2003.
O
bucolismo que havia nos campos em redor
jaz entre
bidons velhos, pedaços de plástico
e bocados
de sucatas enferrujadas.
Há
montureiras de entulho.
Por todo
o lado despejos,
braseiros
de fogueiras fétidas,
piras de
lixo fumegando, cinzas...
Entre
toda a desolação
ovelhas
seu pasto têm,
ruderais
ervas as mantêm.
Mansas
dormem na sombra
de
oliveiras tristes,
deitadas
entre cardos
insubmissos
e agrestes.
Negam a
esterilidade
à secura
cáustica de venenos químicos.
Mesmo
naqueles dias
em que os
pássaros cantam
e há
flores abertas;
mesmo nos
dias claros e quentes,
em que as
praias no mar da paisagem
na linha
do céu ao fundo
estão
cheias de banhistas;
os
sentidos não se comprazem
no
desconsolo daquela ruína.
Dos
barracões gigantes como hangares
o ruído
intenso e monótono espalha-se pela charneca:
O
estrépito cavo das prensas estremece o chão
e marca o
tempo e o contraponto
do
rítmico matraquear das alavancas,
dos
cadenciados estampidos hidráulicos das engrenagens,
dos silvos
pneumáticos dos dispositivos
do
rangido telúrico dos maquinismos…
Lá dentro
há uma neblina:
óleos de
arrefecimento são pulverizados
continuadamente
pela rotação dos tornos revolver,
pela
fricção dos apalpadores nas árvores de excêntricos,
pelo
esmagar das esperas contra os braços que as enlaçam,
pelos
ferros que arranham ferro e arrancam limalhas.
Há
poeiras corpusculares em suspensão
atomizadas
pelo corte dos diamantes
e pelos
jactos de água
nas mós
saturadas das rectificadoras.
De outra
nave sobem vapores espêssos
fumos
turvos dos tanques de imersão
dos
metais incandescentes
no óleo
da têmpera.
Gases
voláteis dos desengordurantes
suspendem-se
nas tinas
até às
serpentinas de condensação.
Aquele
nevoeiro sem esperança
rompe-se
duas vezes por dia,
solenemente,
antes do vazamento.
Oficia o
mestre forneiro
após a
correcção da liga,
lançando
o desescoriante magnésico
naquela
lava metálica líquida,
e então
daquele rubor incandescente
sobem no
ar em aparição
clarões
de relâmpagos atordoantes
e os
olhos parecem cegar
atrás das
pálpebras cerradas.
Naqueles
pavilhões os ciclos mecânicos,
tornam
reflexos e automáticos
os gestos
que os manobram e controlam,
repetitivamente
idênticos como os engenhos.
Um calor
intenso dilui-se dos esforços
os corpos
metálicos rugem febris
com o
arfar dos corpos carnais que os operam.
Óleos
maquinais e suóres misturam-se,
circulam
em refrigeração,
naqueles
corpos animais e
animados
por vezes
é aspergido sangue.
Nos
barracões profundos e escuros
o sol que
nunca se põe
está ali
sobre as cabeças
muito
branco e intenso
concentrado
em tubos de gases raros
em
descargas contínuas
cinquenta
vezes por segundo
fluorescente
em si mesmo.
Nos
barracões disformes,
o tempo
cronométricamente
expressa-se
na na produção a cumprir,
na
precisão e no rigor
sem
espaço para a falha,
afirma-se
na intolerância,
nos
"zero defeitos"
na
ininterruptibilidade,
na
velocidade de execução.
Rotativamente
em ciclos,
corpos
substituem corpos
ausentes
temporáriamente,
em pausa
para dormir,
comer e
se recriarem.
Sempre da
mesma maneira,
exaustivamente:
Três
vezes oito horas por dia.
Em turnos
contínuos.
Passaram
já oito horas desde que cheguei para o recomeço.
Limpo as
mãos ao desperdício de trapo.
Interrompo
as máquinas:
reponho-lhes
ferros afiados,
troco as
pastilhas sinterizadas de metal duro, como diamante.
Meço,
afino tolerâncias, verifico calibres;
confirmo
com calas e padrões,
retomo o
funcionamento,
refaço as
minhas medições,
com o
rigor das dezenas de mícron,
reinicio
o andamento das máquinas.
Cumprimento
o camarada que me veio render.
Entrego
ao chefe de turno o meu gráfico de produção
e as
peças que maquinei.
Saio para
os vestiários.
Abro os
meus cacifos.
Como se
tirasse a própria pele
dispo a
camisa de cotim ultramarino salpicada de óleo,
descalço
as botas gordurosas
sacudo-lhes
a serradura polvilhada
com que é
semeado o pavimento escorregadio da oficina,
às
narinas vem-me de novo o incenso do pinho.
Tiro as
calças manchadas pela farinha cinzenta do aço moído,
hoje
ganhei na ilharga algumas mascarras de fuligem.
Foi nas
garras dos cêstos de têmpera que vieram do revenido.
Sacudo a
roupa para largar as limalhas mais finas.
Do cacifo
da roupa limpa retiro
o cubo de
sabão azul e branco e a toalha.
Dirijo-me
ao balneário
Passo
pelas fileiras de lavatórios.
Entro num
cubículo com chuveiro
abro a
água e fico ali
na
eternidade breve daquele duche
sob a
cascata de água tépida,
ungido de
sabão a derreter,
esvaindo
na espuma os óleos,
o suór e
a atenção concentrada
a que
fiquei obrigado durante oito horas.
Aos
poucos os músculos perdem a tensão,
a moínha
do corpo cansado alastra num afago morno.
Visto-me
com a roupa de andar na rua
sem as
cores e os odores da ganga e do trabalho.
Penteio-me.
Tenho as
unhas limpas,
mas o
fedor do petróleo permanece nas minhas mãos,
com a
escova não o consegui arrancar da pele
nem ele
se diluiu com o sabão na água quente.
Nem dos
poros consegui arrancar o finíssimo pó metálico
que os
assinalou visíveis e cinzentos.
Saio cá
para fora.
Na rua o
ar matinal parece mais fresco,
mais
limpo que o ar nocturno.
Noutro
barracão pico o meu cartão no relógio de ponto.
Tenho a
garganta sêca e o autocarro para apanhar.
Passaram
dezoito minutos desde que larguei as máquinas
Vou a uma
tasca beber uma cerveja rápida… Duas... Três!
Reponho a
água que deixei agarrada ao fato de trabalho.
O
relaxamento muscular é mais completo
a
serenidade apodera-se de mim.
Volto
para casa. “Quase nove horas!”
Ao longe,
no fio do horizonte, a cidade.
Adivinho-lhe,
o frenesim que precede o trabalho diário.
É a hora
de ponta.
Nos
ouvidos o silvo residual
do
barulho ensurdecedor da fábrica.
Entro
numa espécie de letargia
ausento-me
e flutuo imponderal.
Acontece-me
assim sempre
depois do
último dia de trabalho,
no turno
da noite.
Mesmo
quando não bebo umas cervejas.
Sinto-me
bem!
Limpo e
de corpo lavado,
dentro da
roupa de andar na rua.
Entro no
autocarro,
sento-me
no banco como se caísse na cama,
e
adormeço.
(1) (As palavars não são minhas mas sim do insuspeito António Champalimaud.)
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