terça-feira, 30 de novembro de 2010

Onde Deus Talvez exista realmente

Ao Oriente donde vem tudo, o dia e a fé,

Ao Oriente pomposo e fanático e quente,

Ao Oriente excessivo que eu nunca verei,

Ao Oriente budista, bramânico, sintoísta,

Ao Oriente que tudo o que nós não temos,

Que tudo o que nós não somos,

Ao Oriente onde – quem sabe? – Cristo talvez ainda hoje viva,

Onde Deus talvez exista realmente e mandando tudo...

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Nesse dia morria Cristovam Pavia

A taberna estava aberta, mas fria
e nas mesas de pedra vazia
o lioz enegrecia
sem escabeche, sem capilé, nem malvasia.

parecia segredar a carriça
aos tentilhões amortalhados
em gaiolas suspendidas

"Por mor do cantar se curam feridas".



Como eram belos os braços nus
Da mulher agreste encostada à ombreira
a fazer 35 anos
com o olhar de quem se despe

era aquela luz esmaecida
daquele patamar febril
que lhe dava uma sensualidade
bruxuleante que atordoava o dia

"-Ele não está, foi passear!"



No comboio de primeira se vai passear
No comboio de segunda se vai trabalhar

 


-Que maçada tantas horas...
-Cortaram a via! ...mais demoras.
-O comboio parado desoras...
-E logo neste dia...

Aconteceu a morte
De Cristovam Pavia

sábado, 20 de novembro de 2010

Conversa com ouvido mouco.









-É a Cimeira do quê?...

-Cimeira da NATO!
-Do pato?
-Qual pato, qual pata ...da NATO!
-Do pato e da nata? É de gastronomia?
-É da tua tia... é da OTAN!
-Ah pois! deve fazer azia logo de manhã, é muita gordura junta, talvez seja um prato bom mais para o cair da noite.
-Quando te apresentarem a conta logo vês.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O arroz em nós, ou de que maneira temos o Oriente integrado na nossa cultura.

É garantido que antes de Portugal ter conhecimento directo do Oriente já o Arroz tinha chegado à mesa dos mais ricos e dos mais pobres em Portugal.
 Terá sido D. Dinis (1261-1325) que como é sabido tinha uma mulher que era uma Santa, a Raínha Santa Isabel, que introduziu a cultura do arroz nos campos do Mondêgo lá para os arredores de Coimbra.
Este mesmo rei que pelo plantio de milhões de árvores no chamado Pinhal de Leiria permitiu a futura construção naval que levaria ao massivo desenvolvimento da frota marítima e aos descobrimentos, aos achamentos e aos estabelecimentos de rotas, feitorias, malfeitorias e o resto que todos mais ou menos sabemos.
O plantio de milhões de árvores no chamado Pinhal de Leiria (segundo alguns foram só alguns milhares de árvores e para reforçar um pinhal antigo que já existia) veio de facto combater a erosão da faixa litoral, mas também estabilizar as dunas impedindo que estas invadissem as terras de cultivo,  e possibilitar o cultivo de arroz usando uma técnica antiga de consolidação de margens com o enterramento de pinheiros verdes descascados, em solos de aluvião em que o nível freático se torna mais regulável.
E vai daí actualmente cada português come em média 15 kg de arroz por ano, valor muito muito acima de qualquer outro povo na Europa.

 ...bolinhos (pasteis) de arroz
...caldo de arroz, creme de arroz...
...arroz de caril, arroz de açafrão, arroz de manteiga, arroz de tomate, arroz de ervilhas, arroz de feijão, arroz de grêlos, arroz de cenoura, arroz de míscaros, arroz de legumes, arroz de bróculos, arroz de forno, arroz de pimentos, arroz de castanha,arroz de repôlho...
...arroz com tortulhos, arroz com favas, arroz com feijão, arroz com pinhões, arroz com lentilhas, arroz com couves...
...arroz à lagareiro, arroz à crioula, arroz à transmontana...
...arroz frito, arroz branco...
...arroz doce, bolo de arroz...

e isto para só falar de arroz sem carne, sem peixe e sem sangue.
Qualquer destes pratos pode ser feito com arroz integral ainda que um ou outro seja mais indicado para o arroz descascado.
Metade dos pratos talvez seja preferível espécies japónicas de bago grosso tipo o arroz carolino, outras, talvez arroz índico tipo o arroz agulha.
É claro que cada receita é um tema a partir do qual se fizeram muitas variações.
Já vos dei o arroz por isso bom-apetite e bom-proveito.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Cartas por enviar

São muitas as cartas que ficam por enviar.
Não há razão para que eu as não leve a algum ponto bom para sua remessa: as que têm de se entregar num sítio; as que se devem entregar em mão; as que têm de ir para o circuito postal normal.
É verdade que para minha defesa tenho os últimos casos de arte postal que nunca chegaram ao seu destino.
Um dos postais ainda o guardei aqui no dia 7 de Maio, mas dos outros nada ficou. Aprendi que é obrigatório registar qualquer desenho mais "maneirista". Aquele lembrava a maneira das ilustrações para livros infantis do princípio do séc. XX.
Mesmo assim com registo feito lembro-me de uma encomenda que andou meses, perdida em Itália. Depois de muito esforço só possível porque havia um número de registo que assegurava a sua rastreabilidade, veio resposta do serviço postal Italiano: A morada do destinatário estava incorrecta. O destinatário fez prova de que era correcta a morada e depois de documentos de prova tipo recibos de pagamento de água e energia serem entregues é que a encomenda apareceu toda amachucada, não no destinatário, mas sim no remetente, tendo novamente que ser enviada e dessa vez lá chegou vários meses após a expedição inicial.


A  inércia que me apanha quando a carta está encerrada dentro de um envelope não se deve a nenhum destes contratempos. Hoje posso pensar que a falta de vontade em comunicar se deve à própria inutilidade da comunicação; ao desejo de evitar mal entendidos;  à frustração das expectativas que uma inesperada resposta trará.  Amanhã pensarei talvez que é um acto de vaidade egoísta achar que os outros não se sentem importunados com a minha ostensividade, e por isso continuarei sem enviar a carta. Tenho muitas dezenas de cartas assim. Apanhadas neste limbo da minha própria entropia.
É costume dizer que a conversa é como as cerejas que se colhem do ramo aos pares, um assunto sugere outro até que o tempo para a conversa se acabe, que a barriga fique cheia de cerejas. Para mim que gosto de cerejas mas que sempre as digeri com dificuldade, encaro a conversa verbal e também a epistolar como uma viagem  por uma terra de muitos rios. A travessia para a outra margem em alguns, faz-se por grandes pontes, noutros por passo alargado entre pedras que mal despontam das águas. Independentemente do caudal dos rios ou da distância entre margens às vezes a conversa não chega ao outro lado. A conversa vai  distraída no sentido da foz, pelo seu prório pé, ou com  a ajuda da corrente.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

BILLY JOEL - PIANO MAN. Hino ao ser humano comum.

Um anúncio televisivo vai passando uma canção deste homem do piano. Relembro aqui a que lhe deu o nome e a fama. Esta canção mantém-se há mais de trinta anos com o mesmo poder encantatório. Descreve a duplicidade da vida das pessoas vulgares que mantêm os sonhos em adiamento contínuo, a troco da subsistência numa vida em que o seu potencial é desperdiçado.