quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Cartas por enviar

São muitas as cartas que ficam por enviar.
Não há razão para que eu as não leve a algum ponto bom para sua remessa: as que têm de se entregar num sítio; as que se devem entregar em mão; as que têm de ir para o circuito postal normal.
É verdade que para minha defesa tenho os últimos casos de arte postal que nunca chegaram ao seu destino.
Um dos postais ainda o guardei aqui no dia 7 de Maio, mas dos outros nada ficou. Aprendi que é obrigatório registar qualquer desenho mais "maneirista". Aquele lembrava a maneira das ilustrações para livros infantis do princípio do séc. XX.
Mesmo assim com registo feito lembro-me de uma encomenda que andou meses, perdida em Itália. Depois de muito esforço só possível porque havia um número de registo que assegurava a sua rastreabilidade, veio resposta do serviço postal Italiano: A morada do destinatário estava incorrecta. O destinatário fez prova de que era correcta a morada e depois de documentos de prova tipo recibos de pagamento de água e energia serem entregues é que a encomenda apareceu toda amachucada, não no destinatário, mas sim no remetente, tendo novamente que ser enviada e dessa vez lá chegou vários meses após a expedição inicial.


A  inércia que me apanha quando a carta está encerrada dentro de um envelope não se deve a nenhum destes contratempos. Hoje posso pensar que a falta de vontade em comunicar se deve à própria inutilidade da comunicação; ao desejo de evitar mal entendidos;  à frustração das expectativas que uma inesperada resposta trará.  Amanhã pensarei talvez que é um acto de vaidade egoísta achar que os outros não se sentem importunados com a minha ostensividade, e por isso continuarei sem enviar a carta. Tenho muitas dezenas de cartas assim. Apanhadas neste limbo da minha própria entropia.
É costume dizer que a conversa é como as cerejas que se colhem do ramo aos pares, um assunto sugere outro até que o tempo para a conversa se acabe, que a barriga fique cheia de cerejas. Para mim que gosto de cerejas mas que sempre as digeri com dificuldade, encaro a conversa verbal e também a epistolar como uma viagem  por uma terra de muitos rios. A travessia para a outra margem em alguns, faz-se por grandes pontes, noutros por passo alargado entre pedras que mal despontam das águas. Independentemente do caudal dos rios ou da distância entre margens às vezes a conversa não chega ao outro lado. A conversa vai  distraída no sentido da foz, pelo seu prório pé, ou com  a ajuda da corrente.

1 comentário:

Zélia Guardiano disse...

Compreendo-o perfeitamente, amigo Luis!
Também comigo acontece de escrever uma carta, de fazer uma arte postal(sempre muito modesta), e deixá-la envelhecer numa gaveta ou, mesmo, sobre um mável da sala...
Por exemplo: Eu mantinha uma boa troca de cartas e de arte postal com a Tamar, minha grande amiga, do blog Olho do Pombo, e, de repente , aconteceu o que relatei acima: a carta (com arte)foi ficando , foi ficando, e nunca mais partiu...
Acho que precisamos despachar imediatamente , assim que fiquem prontos.
Adorei sua postagem, que me fez refletir acerca do assunto, tão importante no nosso caso...
Enorme abraço, meu amigo!