sábado, 6 de maio de 2023

Eu sou Republicano!



Foi por ideia do meu Pai com a concordância da minha mãe que me chamo Luís Filipe como o Príncipe Real. A culpa terá sido de uma pintura do José Malhoa.
O meu pai que foi soldado na Póvoa do Varzim e de lá trouxe uma veneração respeitosa pelo Mar e pelas Pessoas do Mar, aqueles que ficam na angústia da separação e os que se demoram na ansiedade do não retorno. Veio depois para a Base Aérea nº 1 na Granja do Marquês em Sintra. Aí ganhou um apreço pelas coisas do Ar, um espanto pelo ócio das praias, e uma percepção mística da divindade. A isto não foi alheio o nevoeiro que envolve a montanha e a torna mágica. Conhecida nas notas históricas mais remotas como A Montanha da Lua e à qual nós chamamos Serra de Sintra nela se desenvolve um mistério de brumas que impressionou os românticos do Séc. XIX e ocultistas do Séc. XX. Mas não terá sido apenas isso que ele ganhou. Ganhou também um nome para um desejado filho. Num dos palácios de Sintra, o da Vila ou o da Pena esteve em exposição um quadro retratando uma criança muito bonita, como normalmente são as crianças, acompanhada de um cão enorme. Era o retrato do Príncipe Real D. Luiz Filipe, filho mais velho da Rainha D. Amélia e do Rei D. Carlos. Segundo o que me contou, meu pai no seu pensamento auspicioso terá dito para si próprio: Se algum dia tiver um filho ele chamar-se-á Luiz como meu pai e Filipe como esta criança tão linda.
Muitos anos mais tarde sendo eu já adulto, tive a oportunidade de conhecer essa pintura. Foi numa exposição retrospectiva do pintor José Malhoa, assim que vi o quadro reconheci-o imediatamente: Uma criança loura de cabelo comprido toma apoio pelo antebraço num cão de grande porte de uma raça que não reconheço. Entre o Dogue e o Braco o Castro Laboreiro e o Serra de Estrela. O cão está representado numa ténue obscuridade e parece sólido como uma rocha. A criança traja uma veste azul luminosa como sêda que lhe cai até aos joelhos. Sua cintura é cingida por uma faixa de tecido refulgente de um azul pálido, tão brilhante como o corpete revelado na casaca aberta. Sem dúvida é uma criança esplêndida. Esta criança que nasceu no dia 21 de Março, com a Primavera do ano de 1887 teve vida breve. A sua vida que como as flores, foi colhida precocemente, viria a terminar no Terreiro do Paço em Fevereiro de 1908 no atentado que também vitimou D. Carlos. O regicídio dois anos depois a 5 de Outubro de 1910, viria a culminar no fim da Monarquia em Portugal. Sempre que passo a pé pelo Terreiro do Paço junto ao local onde aconteceu o atentado lembro-me desse jovem de quem sou homónimo. Associo-o com outra coisa que aprendi com o meu pai. Gostar de flores, mas sem as cortar para as colocar numa jarra. Sempre que ofereci flores, ofereci toda a planta no vaso. Não se colhe o que já tem vida breve, e a Vida é sempre breve.
Dito isto eu sou Republicano. Até semanticamente. Não como “Pão Real”, nem beberia “Fruto Real” se a marca ainda existisse, bem poderia ir ao Rei dos Frangos mas não comeria “Frango Real” e se gostasse de futebol não seria nem do Real Sport Club Massamá nem do Real Madrid.
Dito isto Viva a República!

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