sábado, 23 de agosto de 2014

Cor de laranja ou a cor que não tem nome.



Chamamos-lhe cor de laranja. Mas poder-se-lhe-ía chamar cor de alperce, cor de abóbora, cor de cenoura; cor de açafrão ou cor de curcuma. Ou melhor ainda, cor de ocaso, ou cor de fogo, ou cor de Oriente.
No Oriente esta cor sem nome que se agarra àquilo que a ilustra, era uma cor de pobreza. No Oriente os mendigos cobriam-se com mantos tingidos dessa cor. Por isso quando Siddhartha Ghautama, aquele ser a quem chamaram Buda, atingiu a Iluminação, fez desse manto a sua veste em sinal de despojamento. Desde então essa cor é também por isso, uma cor de sabedoria e de santidade.

Na época medieval a cor sem nome, amarelo avermelhada, simbolizava a cobiça, a fúria, a insanidade e a morte.

Talvez que a esta carga simbólica de violência não fosse alheio o facto de serem usados desde a antiguidade pigmentos altamente tóxicos obtidos de minerais de arsénio e enxofre, realgar e orpiment ou ouro-pigmento que são sulfuretos de arsénio. Foi com estes pigmentos obtidos dos minerais triturados que se pintaram belos túmulos egípcios, templos gregos, frescos romanos, ícones ortodoxos, iluminuras, ...e pontas de seta. As belas pontas de seta que assim oxidavam menos e matavam melhor. Quem não morria da ferida logo morria do envenenamento. Não é feito Ocidental exclusivo pois parece que o pó mineral cor de ouro também era usado no Oriente, na China, era usado para matar não só os humanos mas também os ratos.

A bela côr “alaranjada” dos códices medievais feita de arsénico e enxofre é mais um daqueles homicidas prodigiosos de que fala Umberto Eco no “Nome da Rosa”.



Pelo séc. XVI os portugueses que tinham chegado ao Oriente, de lá trazem e espalham laranjas e laranjeiras por todo o lado.  Até o capitão da Nau Catrineta tinha um laranjal. Todos os quintais têm uma ou mais laranjeiras,quem diga que cá ficavam com as doces e para fora vendiam as amargas. Mas mesmo dessas laranjas amargas alguém que terá partido de Portugal para Inglaterra com uma tal Catarina decidiu fazer o que fazia aos intragáveis marmelos e por isso a marmelada que os Ingleses comem nada tem a ver com marmelos mas sim com laranjas.

O sucesso  das laranjas foi tal que a Casa de Nassau e Arausio uma pequena localidade fundada em 36 a.C. pelos Romanos onde outrora se cultuava uma divindade céltico-latina das águas e das fontes adoptou o nome Orange e mais do que tudo adoptou a cor da laranja. A Casa de Orange continua a reinar na Holanda e o Laranja é a cor com que os holandeses se identificam mesmo sem saberem porquê.

Nos dias de hoje de normas e directivas; de leis e de mais leis, a cor de laranja foi escolhida pela marinha como a cor das bóias, dos coletes de salvação e das embarcações de socorro. Por ser uma cor visível com pouca luz, por se destacar mesmo na obscuridade quase total e por ser ainda uma cor rara no mar e na natureza, associada à produção humana.

Náufragos antigos que sobreviveram a ataques de monstros marinhos atribuíram a essa cor o poder de repelir tais predadores; marinheiros de navios afundados durante a Segunda Guerra Mundial referiram o mesmo no que se julga hoje terem sido ataques de lulas gigantes ou tubarões.
 Infelizmente a cor de laranja também foi a cor escolhida para ser a cor dos prisioneiros. Prisioneiros condenados ou inocentes, julgados ou sem direito a justiça alguma.
Cor de laranja é a cor das roupas dos torturados, dos supliciados.

Se a infâmia e a ignomínia têm cor essa parece ser a cor de laranja.

O antigo valor simbólico medieval desta cor sem nome está a ganhar importância e de novo parece querer colorir a morte.

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