Disse-lhe que eu não era um desenhador de paisagens.
Claro que poderia ter-lhe feito a planta rigorosa do local: como um dédalo tomado do alto por um vôo suspenso de falcão.
Mas não, o que ela queria era uma paisagem. Para emoldurar e pendurar na parede como essas que se vêem nos museus.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgpftk9hLzWeEhxRziOv4FBhVNdx1mXkW3lYm2bQFE46BWNBkIL_1EDFZVmAiDXcVzZnSmC3o92q1Un4OMef9yvhx7r2SFTYqRThRfIMm34bWI3b3R5Ppv4q0-PXgNQpe092pLPVhCMfc0/s1600/paisagem.jpg)
O que ela queria era uma peça artística, um contributo pessoal. A minha visão sobre aquele ponto de vista.
Quando lhe levei o desenho ficou imóvel de espanto e depois mergulhou numa prostração como se nada mais valêsse a pena.
No meu desenho o ambiente era-lhe familiar mas não era aquela a paisagem que guardara na memória, pela primeira vez via o que lhe disseram existir sem ela ter reparado, mas também o que se recusara sempre a encarar. O que a traumatizava não era o que se tinha alterado mas sim o que sempre lá estivera e lá continuava. Pior do que isso era eu ter desenhado a paisagem sem essa cegueira protectora, sem essa transplantação de alma que permite a existência quotidiana sem culpa nem remorso.
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