Tantos livros que acabaram censurados que não é de ânimo leve que se apagam palavras para que outras se revelem.
Mas é assim uma forma de despertar para o ponto, a linha, o traço, a mancha.A rasura, o sublinhado, a circunferência à volta de uma palavra, a nota à margem, a correcção ou o aditamento. Quase todos o fizémos em livros de estudo ou em jornais de forrar o caixote do lixo.
As comunicações secretas dos códigos mais simples eram passadas com uma matriz perfurada que ao ser aplicada sobre a página de um livro não raras as vezes a Bíblia permitia a leitura de uma mensagem.
Debruavam-se furinhos abertos na trama de lencinhos alvos, caseavam-se orifícios, e bordavam-se folhas e flores em torno de delicados recortes abertos por minúsculas tesouras curvas. Lencinhos que ficavam perdidos no banco da igreja ou se deixavam cair no chão certo na altura exacta.
A "blackout poetry" que em português poder-se-á chamar a poesia da ocultação ou mesmo até a poesia da revelação invoca também o conceito da transparência, da forma e do fundo e remete para o palimpsesto que é aquilo que ainda resta e é possível ser lido e apreendido após um processo de apagamento, encobrimento ou lavagem.
Contudo não é de ânimo leve que rasgo páginas de livros ou que as risco. Mas manifestei o desejo de desenhar e participar na iniciativa. Então nos dois minutos que concedi à espera de quem me acompanhava, escrevi com as palavras que já estavam na folha que me deram:
"Não! Não rasgues obras de inegável mérito."
1 comentário:
Extraordinario. Não conhecia o termo. Adorei a explicação!
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