segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

António Rosado nada teme! Nem mesmo o Concerto nº 2 de Prokofiev.


E não é coisa de somenos porque dizem que até o próprio Prokofiev evitava tocar este concerto que permanece até hoje como o mais difícil de ser tocado.
Prokofiev que era um virtuoso, não se deixaria intimidar pela evidente dificuldade técnica, mas talvez sim pela parte emocional que terá também afastado da interpretação deste concerto o seu amigo Sviatoslav Richter.  A dificuldade técnica pode ser tão avassaladoramente exigente que o intérprete pode cair na armadilha de sacrificar a expressão à concretização do desempenho, não entendendo que a expressão é a chave para a superação da dificuldade de execução da obra. Mas isto sou eu a falar.
Fica aqui uma amostra mais exuberante do que digo, no "scherzo vivace" que na minha opinião é um eufemismo que Prokofiev usou para significar furioso com raiva, "furioso arrabbiato".
Afinal este concerto que talvez tenha sido composto como resposta a uma carta de despedida que o seu amigo Maximilian Schmidthof lhe deixou antes de se suicidar, é também uma homenagem diferente da que se poderia esperar de um requiem. 
Prokofiev que começou a compor a obra por volta dos 21 anos, completa-a aos 22 anos em 1913, logo após a morte do amigo, e executa-a sem a parte da orquestra. A reacção do público não terá sido diferente da que ainda hoje uma primeira audição poderá causar em ouvintes menos pacientes: causou escândalo. Mas ao mesmo tempo granjeou-lhe uma aura de compositor inovador. Aquela música transmitia a revolucionária modernidade de um mundo que fervilhava em mudança.
Entretanto nas convulsões a seguir à Revolução Russa de 1917 a partitura perde-se num incêndio e Prokofiev vem a reescrevê-la mais tarde em 1923, numa altura em que retrospectivamente se dava conta que parte da juventude europeia sua contemporânea fora sacrificada na carnificina da Grande Guerra Mundial, à qual se somava o horror da mortandade da Guerra Civil que veio ainda a persistir na Rússia para a consolidação do poder no Estado Soviético. Tudo isto, penso eu que terá contribuído para fixar definitivamente neste concerto, uma carga trágica pesada que é raro encontrar em outra música que me lembre ter ouvido. 
A meu ver o Concerto nº 2 para piano e orquestra, é uma obra que termina abruptamente, mas acho que é assim que quase sempre se detêm os nossos pensamentos, nos estacam os nossos medos face ao desconhecido e que quase sempre acaba a vida.


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