Montagem da peça Memorial à Impermanência. |
MEMORIAL À IMPERMANÊNCIA
(portal para outra dimensão de nós
mesmos)
As portas são uma metáfora para a liberdade e para a
intimidade. Quando abertas permitem a passagem de um espaço para outro. Quando
fechadas encerram e tornam privado o que se quer proteger e reservar. Diversas
são as portas: na sua transparência, na sua solidez, na sua permeabilidade e
assim também no seu objectivo. As portas podem guardar o sagrado, e de igual
modo podem guardar o assustador e o terrível. Num e noutro caso parecem
isolar-nos do medo. É preciso vencer o medo quando se escolhe abrir uma
porta, quando em fuga se deixa uma realidade por mais horrível que ela possa ser por
outra totalmente desconhecida.
As cadeiras são o símbolo de poder. Na Europa cultivou-se a
imagem do poder soberano associando-o a uma cadeira grande, um trono. Os
portugueses das navegações sentavam-se em cadeiras enquanto os representantes
dos povos que os recebiam se sentavam no chão. Na língua inglesa, aquele que
preside ainda é o homem da cadeira, o “chairman”. A cadeira é a imagem que aos
outros damos de nós próprios, é o ego. Simultâneamente a essência do ser,
naquilo que ele tem de mais imaturo e naquilo que ele tem de mais evoluído e
transcendente.
Estas portas já não guardam relíquias ou tesouros, não se
podem fechar à chave. Continuam porém a consagrar a função para a qual foram
concebidas, em conjunto formam um portal. Uma pausa no átrio onde cada um se
situa face ao momento seguinte. Nelas ainda é legível o desvelo na sua
construção: os vidros biselados que deixavam ver as porcelanas antigas vindas
da China, as aberturas por onde se desprendia o aroma das maçãs que amadureciam
ao longo do Inverno… Lado a lado com as portas os fragmentos das cadeiras aparecem como uma liberdade
poética de tudo isto. A sua disposição no conjunto cria no olhar uma dinâmica rotativa de movimento. A transitoriedade do que foi outrora sólido e
institucional, do que foi tirânico e inamovível.
O “MEMORIAL À IMPERMANÊNCIA” é um memorial a nós próprios,
mas também aquilo que nos oprime e que julgamos definitivo.
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